Comp na Vida Real

Quem responde às perguntas?

Comp na Vida Real: quem responde às perguntas?

Estudei na Unicamp e comecei programando em Pascal. Fundei minha empresa em 1987.

Escolhi Computação por um bom motivo: queria curtir a juventude com grana no bolso.

Mas no primeiro ano da faculdade as coisas não saíram como eu esperava: nas primeiras provas, tirei entre zero e um. Consegui passar fazendo um esforço absurdo, com notas mínimas. Por isso, no segundo ano, resolvi que ia mudar de curso. Só que eu tomei uma decisão: “Não vou sair derrotado”. E foi aí que tudo mudou.

Estas perguntas e respostas foram publicadas originalmente no nosso perfil no Instagram: @compvidareal

Você trabalha com o quê? Como você sabe tudo sobre as respostas daqui? 

Sou CEO de uma empresa de software com 120 funcionários que fundei há 32 anos.

Durante esse período participei de vários outros empreendimentos na área de tecnologia, ainda sou sócio de alguns.

Estudei Computação na Unicamp e fiz mestrado em Administração na FGV-EASP.

 

Como foi o seu início de carreira/estudo em computação? 

Fiz Computação na Unicamp e fui operador do Mainframe da escola enquanto estudava.

Meu TCC foi um compilador de uma linguagem concorrente e foi usado na disciplina de Sistemas Operacionais da turma seguinte.

Estagiei em um projeto de sistema operacional e BIOS para PC programando em assembly.

Comecei minha carreira no CPqD Telebrás em um time que construiu um compilador de uma linguagem semelhante a ADA chamada Chill.

Programávamos em Pascal em um computador da DEC chamado Vax.

Trabalhei depois em um porte de sistema operacional Unix para uma máquina de 32 bits, fazendo device drivers e o código responsável pela memória virtual e paginação. Programava em linguagem C.

Daí abri minha empresa e desenvolvi protocolos de comunicação para automação bancária.

Finalmente, migramos para a criação de aplicações, especialmente para o setor financeiro e meios de pagamento, onde atuamos até hoje.

 

O que você diria para alguém que está com muita dificuldade no curso Ciência da Computação e pensa em desistir? 

Daria o meu próprio exemplo, também passei por isso. Deixe eu lhe contar isso em mais detalhes.

Cursei o ensino médio em uma escola estadual e tinha pouca base em matemática, que nem era minha matéria favorita.

Resolvi fazer Ciência da Computação por sugestão de um primo mais velho, que tinha uma carreira bem sucedida em um grande banco, e que eu admirava muito.

Na época ele me contou que os profissionais de informática desse banco eram bem remunerados e tinham muito prestígio, que Computação era a profissão do futuro.

Olhando agora para trás, e lá se vão exatos 40 anos, ele acertou em cheio nessa previsão!

Juventude com grana 

Mas o argumento matador dele foi: “Se você estudar Computação, vai ser bem remunerado desde o início da carreira e vai poder curtir a juventude com grana no bolso, e não nessa dureza em que vive hoje!”

Naquela época não existiam microcomputadores, e eu jamais havia sequer visto um computador de perto.

Não tinha a mínima ideia do que se tratava a tal da “Ciência da Computação”. Existiam pouquíssimos cursos superiores: USP (São Paulo e São Carlos), Unicamp, Mackenzie, UFSCar, FATEC e creio que era só…

Junto com o terceiro ano do ensino médio fiz um cursinho pré-vestibular.

Naquela época, o ingresso na Unicamp era pela FUVEST, e optei por ela porque na USP o aluno ingressava em Matemática e, em função das notas, depois podia optar por Computação a partir do segundo ano.

Prestei o vestibular e só consegui passar porque minhas notas nas provas das disciplinas de humanas foram excepcionais, nas de exatas foram muito ruins.

A falta de base matemática cobrou seu preço 

Já no primeiro semestre, minha base deficiente em exatas cobrou seu preço.

Outros fatores contribuíram para a tragédia: falta de disciplina, falta de método de estudo, imaturidade e o fato de não estar habituado ao forte ritmo de estudos exigido pela escola.

Minhas notas nas primeiras provas ficaram todas dentro da curva normal, isto é, entre zero e um!

Os temas das disciplinas eram incompreensíveis para mim, e eu estava perdido e desanimado.

Mas, com um esforço muito acima do que jamais havia dedicado a qualquer outra coisa em toda minha vida, sobrevivi e consegui milagrosamente recuperar as notas e salvar o semestre.

O segundo semestre não foi muito melhor e, embora eu tivesse constatado que, com muito esforço, seria possível seguir adiante, eu estava infeliz, sem auto-confiança, e não conseguia gostar do que estava estudando.

Virando o jogo

No início do segundo ano resolvi que iria mudar de curso, e que prestaria um novo vestibular no final do ano.

Mas, ao mesmo tempo ocorreu-me que, desistindo daquele jeito, eu sairia do curso derrotado. Então, resolvi que sairia por cima.

Decidi então me dedicar ainda mais.

Consegui um trabalho não remunerado como operador do Mainframe da universidade, e passei a fazer plantões semanais no domingo à tarde/noite, e estudei detalhadamente os manuais daquele computador.

Claro, à medida que eu estudava, mais me interessava, mas ainda existia alguma resistência dentro de mim que me fazia gastar mais energia do que o necessário para realizar as tarefas relacionadas aos estudos.

Daí, surgiu o primeiro resultado: logo no início do segundo semestre, em reconhecimento ao meu esforço, surgiu uma vaga e fui efetivado na equipe de operadores do Mainframe.

Comecei a ganhar meus primeiros caraminguás.

Quando um exemplo faz toda diferença

Então, naquele mesmo quarto semestre do curso eu tive um professor, na disciplina de complexidade de algoritmos, que demonstrou nas aulas algo que nenhum outro tinha manifestado ainda: paixão pela Computação.

Durante a transmissão dos temas das aulas, os olhos desse professor brilhavam, ele vibrava e se emocionava.

Isso acendeu uma luz dentro de mim: ” deve haver algo de muito belo nesses temas para alguém gostar tanto assim disso tudo, e eu é que sou ignorante a ponto de não perceber essa beleza!”

Então, eu parei de resistir. Eu vislumbrei a possibilidade de também gostar do assunto. E foi o que aconteceu.

A partir daí, passei a ser impulsionado pela energia do prazer de encontrar as razões por trás dos teoremas, de entender a lógica que sustenta e interliga todos os temas, e de reconhecer as leis gerais que dão sentido a cada instância de cada solução.

O que me trouxe até aqui

Nesse ponto, obviamente, deixei de lado a ideia de desistir do curso.

Meu rendimento escolar decolou e os dois últimos anos de faculdade foram maravilhosos.

Mas, o principal resultado foi a lição que extrai e carrego para toda a vida: não há o resista à energia da vontade, e é possível encontrar o ponto de atração em qualquer tema.

É preciso romper a casca da superficialidade para encontrar a beleza que está guardada mas camadas mais profundas do conhecimento, e a energia gerada pelo prazer de encontrá-la vai servir de impulso para se conquistar um prazer mais intenso ainda!

Espero que você tenha sobrevivido a esse longo relato e ainda esteja me acompanhando.

O que posso lhe garantir, pela minha experiência, é que vale muito a pena insistir, muito mesmo!

Mais do que suplantar as atribulações de um momento difícil e a complexidade de um curso exigente, se você conseguir ser bem sucedido nessa jornada vai obter a maior vitória que existe: vencer a si mesmo!

E essa vitória você vai levar para o resto da sua vida. Estou torcendo por você!

 

Quais coisas se arrependeu na sua carreira principalmente no começo? 

Não chega a ser um arrependimento, mas abri minha empresa bem preparado do ponto de vista técnico, mas sem nenhuma visão e experiência em marketing e vendas.

 

Qual o projeto mais legal que você já participou?

Hmmm… Não tem um só, cada um teve seus próprios desafios. Participei da construção de:

  • vários compiladores,
  • protocolos de comunicação,
  • device drivers,
  • um kernel de tempo real,
  • um roteador e conversor de protocolos de altíssimo desempenho e confiabilidade para transações bancárias,
  • mais de um sistema de automação de agências bancárias…

Todos tão úteis e tão utilizados, tenho orgulho de todos eles!